O melhor do abraço é o charme de fazer com que a eternidade caiba em segundos.
Ana Jácomo


Com o tempo


Tenho aprendido com o tempo que a felicidade vibra na freqüência das coisas mais simples. Que o que amacia a vida, acende o riso, convida a alma pra brincar, são essas imensas coisas pequeninas bordadas com fios de luz no tecido áspero do cotidiano.

Ana Jácomo

quinta-feira, 3 de março de 2011

AS ROSAS


"As Rosas


Quando à noite desfolho e trinco as rosas
É como se prendesse entre os meus dentes
Todo o luar das noites transparentes,
Todo o fulgor das tardes luminosas,
O vento bailador das primaveras,
A doçura amarga dos poentes,
E a exaltação de todas as esperas."


Sophia de Mello B. Adresen


ROSAS
Frágeis filhas da Aurora e do Mistério,
Rosas que despertais virgens e frescas,
Sorrindo entre os espinhos e as folhagens,
Nos roseirais sadios e viçosos.


Rosas débeis, que os ventos assassinam,
Sois a forma e a expressão do próprio efêmero,
Na luta natural incerta e cega.
Sois o instante de Pausa e Sutileza.


Rosas que as mãos da noite despetalam,
Sois o triunfo do Amor e da Harmonia
Sois a imagem tranqüila da Beleza.

Rosas que alimentais meu olhar enfêrmo,
Rosas, vós sois da terra humilde e escura
Um gesto puro, um alto pensamento!


Augusto Frederico Schmidt

Traze-me















Traze-me

Traze-me um pouco das sombras serenas
que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares
que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!
- Vê que nem sequer sonho - amor!

 Cecília Meireles



A Dança

Não te amo como se fosses rosa de sal, topázio

ou flecha de cravos que propagam o fogo:
te amo como se amam certas coisas obscuras,
secretamente, entre a sombra e a alma.


Te amo como a planta que não floresce e leva
dentro de si, oculta, a luz daquelas flores,
e graças a teu amor vive escuro em meu corpo
o apertado aroma que ascendeu da terra.
Te amo sem saber como, nem quando, nem onde,
te amo diretamente sem problemas nem orgulho:
assim te amo porque não sei amar de outra maneira,


senão assim deste modo em que não sou nem és
tão perto que tua mão sobre meu peito é minha
tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho.



Pablo Neruda



Meu Sonho

Parei as águas do meu sonho
para teu rosto se mirar.
Mas só a sombra dos meus olhos
ficou por cima, a procurar…
Os pássaros da madrugada
não têm coragem de cantar,
vendo o meu sonho interminável
e a esperança do meu olhar.
Procurei-te em vão pela terra,
perto do céu, por sobre o mar
Se não chegas nem pelo sonho,
por que insisto em te imaginar?
Quando vierem fechar meus olhos,
talvez não se deixem fechar.
Talvez pensem que o tempo volta,
e que vens, se o tempo voltar.
Cecília Meireles
***





Se Minhas Mãos Pudessem Desfolhar


Se Minhas Mãos Pudessem Desfolhar

Eu pronuncio teu nome
nas noites escuras,
quando vêm os astros
beber na lua
e dormem nas ramagens
das flolhas ocultas.
E eu me sinto oco
de paixão e de música.
Louco relógio que canta
mortas horas antigas.

Eu pronuncio teu nome,
nesta noite escura,
e teu nome me soa
mais distante que nunca.
Mais distante que todas as estrelas
e mais dolente que a mansa chuva.
Amar-te-ei como então
alguma vez? Que culpa
tem meu coração?
Se a névoa se esfuma,
que outra paixão me espera?
Será tranqüila e pura?
Se meus dedos pudessem
desfolhar a lua!!

Federico García Lorca




O Amor Quando Se Revela

 
O AMOR, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe,
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...

Fernando Pessoa







segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Limites do Amor


Limites do Amor
Affonso Romano de Sant’anna

Condenado estou a te amar
nos meus limites
até que exausta e mais querendo
um amor total, livre das cercas,
te despeça de mim, sofrida,
na direção de outro amor
que pensas ser total e total será
nos seus limites da vida.

O amor não se mede
pela liberdade de se expor nas praças
e bares, em empecilho.
É claro que isto é bom e, às vezes,
sublime.
Mas se ama também de outra forma, incerta,
e este o mistério:

- ilimitado o amor às vezes se limita,
proibido é que o amor às vezes se liberta.
Ele quis morrer para arrasar a morte e voltar.

Fragmento 2

Affonso Romano Sant'Anna



Eu sei quando te amo:

é quando com teu corpo eu me confundo,

não apenas nesta mistura de massa e forma,

mas quando na tua alma eu me introduzo

e sinto que meu sangue corre em ti,

e tudo que é teu corpo

não é que um corpo meu

que se alongou de mim.



Eu sei quando te amo:

é quando eu te apalpo e não te sinto,

e sinto que a mim mesmo então me abraço,

a mim

que amo e sou um duplo,

eu mesmo

e o corpo teu pulsando em mim




PRETENSÃO


Quero um janeiro,

um sábado,

um banco de jardim,

uma tarde com vista para o mar.



E um lugar nas tuas mãos,

para as minhas.


Helena C de Araújo

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010



AS MÃOS
Tenho para te dar as mãos vazias
e pouco mais, mas olha como são
as minhas mãos, que outrora foram frias
e hoje ardem ao calor da emoção
de sentir como espantam as sombrias
noites em que o negrume e a solidão
eram a manta com que te cobrias.

Torquato da Luz



 

Agora que o silêncio é um mar sem ondas,

E que nele posso navegar sem rumo,

Não respondas 

Às urgentes perguntas

Que te fiz. 

Deixa-me ser feliz 

Assim,

Já tão longe de ti como de mim. 

Perde-se a vida a desejá-la tanto. 

Só soubemos sofrer, enquanto 

O nosso amor

Durou. 

Mas o tempo passou, 

Há calmaria... 

Não perturbes a paz que me foi dada. 

Ouvir de novo a tua voz seria

Matar a sede com água salgada. 

Miguel Torga






DESESPAÇO

Tua falta é,

a todo instante,

tua falta.

Só não consigo entender

esse vazio equivocado,

que fica repleto de ti.


Helena C. Araújo

Quando penso que,

Por medo,

Escaparam-me

Por entre os dedos,

Sonhos e oportunidades...

Que, por ter dormido todo o outono,

No inverno perdi o sono...

E deixei fugir a felicidade!

Que, por paixão,

Queimei, ardi, enlouqueci...

E por um falso desejo,

Errei, temi, trai, feri...

Que por me faltar coragem,

Meu coração, hoje, diz:- Você teve medo de ser feliz.

Porém, no entanto, entretanto...

Meu Deus! E... portanto.

Felizmente,Há perdão – para os erros.

E silêncio – para os berros.

Para o tudo que nada foi – ainda há tanto.

Para este amor impossível – ainda há tempo!

Ah, essa tal felicidade!

Marcos Aurélio Mendes

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

"O vento é sempre o mesmo, 
mas sua resposta é diferente 
em cada folha. 
Somente a árvore seca 
fica imóvel entre 
borboletas e pássaros". 

Cecília Meireles

Lua adversa Cecilia Meireles Tenho fases, como a lua. Fases de andar escondida, fases de vir para a rua... Perdição da minha vida! Tenho fases de ser tua, tenho outras de ser sozinha. Fases que vão e que vêm no secreto calendário que um astrólogo arbitrário inventou para meu uso. E roda a melancolia seu interminável fuso! Não me encontro com ninguém (tenho fases, como a lua) No dia de alguém ser meu não é dia de eu ser sua... E, quando chega esse dia, o outro desapareceu...

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti…
 Mario Quintana

quinta-feira, 30 de setembro de 2010


A canção que era nossa
Agora é todinha sua...
Fico sozinho, sem bossa,
Perambulando na rua.
Canção sem amor não entrosa,
Não tem verso nem é prosa -
Falta o perfume da rosa
Perde o encanto da lua...


A canção que era nossa,
Aquela que escolheu,
Tão de repente chegou,
Tão prematura morreu...
E eu aqui curtindo a fossa
Nesse fosso que é só meu.


A canção que era nossa
Que sequer eu pude ouvir,
Deixa-me aqui a sonhar
Em acorde e sinfonia
Mas sem ter a alegria,
O direito de gostar...
Pois a canção que era nossa
Eu nunca pude escutar.


Antonio Manoel Abreu Sardenberg
 
Fragmento 1
Afonso Romano de Sant'Anna

Tu sempre foste una

e sempre foste minha,

ainda quando a cor e a forma tua se fundiam

com outra forma e cor que tu não tinhas.

Por isto é que te falo de umas coisas
que não lembras
nem nunca lembrarias

de tais coisas entre mim e ti

ainda quando tu não me sabias

e dividida em outras te mostravas

e assim dispersa me ouvias.
 
Tu sempre foste uma

ainda quando o corpo teu

com outro corpo a sós se punha,

pois o que me tinhas a dar

a outro nunca o deste

e nunca o doarias.


Por isto é que te sinto

com tanta intimidade

e te possuo com tanta singeleza

desde quando recém vinda

ostentavas nos teus olhos grande espanto

de quem não compreendia

a antiguidade desse amor que em mim fluía.






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